sábado, 14 de dezembro de 2024

DISCURSO DE POSSE DE NANDO POETA NA PRESIDÊNCIA DA ACADEMIA NORTE-RIO-GRANDENSE DE LITERATURA DE CORDEL (ANLIC)

Confrades e confreiras, amigos e amantes do cordel,

Elaborar uma descrição de 600 caracteres sobre a posse da nova diretoria da Academia.nesta sexta feira 13 Nando Poeta é empossado na Presidencia da Academia Norte-Rio-Grandense de Literatura de Cordel junto com a nova diretoria, o cordelista Nando poeta, proferiu em seu discurso:

Com o coração pulsando de emoção e o espírito carregado de responsabilidade, assumo hoje a presidência da Academia Norte-Rio-Grandense de Literatura de Cordel. Este momento marca um capítulo especial em minha caminhada, uma travessia que se entrelaça com os versos do cordel, essa arte que é luta, memória e sonho. O cordel nos conecta ao passado que nos moldou e nos impulsiona para um futuro a ser escrito com poesia e resistência.

Antes de tudo, rendo minha homenagem a Tonha Mota, que liderou nossa Academia com firmeza e delicadeza nos últimos seis anos. Desde a fundação do Ponto de Memória Estação do Cordel, em 2017, Tonha tem sido um farol na luta pela valorização do cordel, inspirando-nos com seu legado. Minha profunda admiração e gratidão a você, Tonha. Agradeço também aos confrades e confreiras que abraçaram e apoiaram a formação desta nova diretoria, confiando em nosso compromisso de avançar e fortalecer ainda mais a nossa Academia.

Nos últimos anos, temos testemunhado o florescer do cordel e do repente no solo potiguar. Entramos no século XXI com um punhado de poetas que cabiam na palma da mão, um grupo restrito, mas repleto de paixão. Hoje, duas décadas depois, demos um salto que ecoa pelos sertões e cidades: o cordel potiguar cresceu e se ramificou em inúmeros espaços de propagação dessa arte.

Movimentos como o dos poetas mirins e o brilhantismo de homens e mulheres que conquistam prêmios em concursos pelo país revelam a força dessa tradição. Entidades como a Casa do Cordel, a Academia de Trova, e o Ponto de Memória Estação do Cordel simbolizam essa expansão e consolidam o cordel como um pilar vivo e pulsante da cultura potiguar. Este avanço não é apenas motivo de orgulho, mas um chamado à responsabilidade de fortalecer ainda mais essas raízes.

Vivemos tempos contraditórios: enquanto o cordel é reconhecido como patrimônio imaterial do Brasil, ainda enfrentamos o abandono das políticas públicas, que ignoram sua importância cultural e histórica. Cabe a nós, cordelistas e defensores dessa arte, resistir, inovar e avançar. Aceitamos este desafio com o compromisso de conduzir esta Academia por um único mandato, renovando nosso estatuto e incentivando a participação ativa de todos os acadêmicos na construção de uma gestão plural e vibrante.

Nosso Brasil, tão rico em diversidade, ainda permite que equipamentos culturais como o Memorial Câmara Cascudo e o Museu Café Filho se transformem em cenários de descaso e esquecimento. Ao mesmo tempo, instituições como a nossa enfrentam a carência de espaços para florescer. Não podemos aceitar a cultura relegada às sombras. Nossa Academia será uma trincheira luminosa, em defesa da arte do cordel e de sua presença viva no cotidiano do nosso povo.

O cordel é muito mais que poesia; é o murmúrio das águas e o sussurro do vento nas veredas de nosso chão. É o grito do trabalhador e o canto do oprimido. É o retrato do povo em busca de justiça. Neste ano renovamos nosso compromisso com essa tradição, fazendo dela um instrumento de transformação e esperança.

Nossa gestão será guiada pela valorização do cordel como arte e ferramenta de inclusão, com ações que buscam ampliar seus horizontes e preservar sua essência. Entre nossas propostas, destaco:

  1. Formação e Capacitação – Oferecer oficinas e cursos para educadores e jovens talentos, formando novas gerações de poetas.
  2. Atividades Itinerantes – Realizar encontros em diferentes regiões, levando o cordel aonde o povo está.
  3. Preservação do Patrimônio – Criar um memorial físico e digital para eternizar a história do cordel potiguar.
  4. Reconhecimento e Valorização – Instituir o Troféu Cordel Potiguar e lançar antologias anuais para celebrar nossos talentos.
  5. Parcerias Estratégicas – Fortalecer vínculos com universidades e outras instituições culturais, consolidando o espaço do cordel no cenário nacional.

6.    Promover a criação de um fórum não governamental que reúna instituições como a ANLIC, a Comissão Norte-Riograndense do Folclore, a Academia de Trovas, a Casa do Cordel, o Ponto de Memória Estação do Cordel, entre outras. Esse fórum deverá articular e construir, de forma colaborativa, uma pauta estratégica que represente os interesses e demandas do setor cultural, para ser apresentada de maneira unificada aos gestores públicos.

7.    Lutaremos incansavelmente por mais investimentos na cultura do nosso estado, pois não podemos nos calar diante dos atrasos no pagamento dos RPV destinados aos mestres e espaços culturais, responsabilidade que o governo insiste em negligenciar. É inadmissível aceitar o abandono dos equipamentos culturais públicos; nossa luta é por ocupá-los e revitalizá-los, devolvendo à sociedade espaços de arte e convivência.

8.    Rejeitamos, com veemência, a dependência das chamadas "emendas pix" dos parlamentares, que buscam transformar os movimentos culturais em meros currais eleitorais. Nosso compromisso é com uma cultura livre, autônoma e acessível, onde a arte seja reconhecida e valorizada como um direito de todos e não como moeda de troca política.

Convido cada um de vocês a caminhar ao nosso lado. Que os versos do cordel sejam nosso estandarte e que a poesia seja nossa espada, abrindo caminhos para um futuro onde nossa arte ocupe o lugar de destaque que merece. Unidos, faremos do cordel uma bandeira de luta, de cultura e de liberdade.

Reafirmo, com a força dos versos e a coragem dos poetas, meu compromisso com o presente e o futuro do cordel. Viva o cordel brasileiro! Viva a cultura popular!                                                              Natal, 13 de dezembro de 2024.


 

A Trajetória Artística e Cultural de Nando Poeta e Discurso de Posse na Academia Norte-rio-grandese de Literatura de Cordel

Nando Poeta é uma das vozes mais representativas da literatura de cordel no Brasil, destacando-se como um intelectual comprometido com a preservação e promoção dessa tradição cultural. Sua trajetória é marcada por inúmeras conquistas que abrangem a crítica social, a educação e o engajamento político. Atual presidente da Academia Norte-rio-grandense de Literatura de Cordel, é também membro ativo da Comissão Norte-rio-grandense de Folclore e um dos organizadores do Ponto de Memória Estação do Cordel, localizado em Natal, Rio Grande do Norte.

Origens e Primeiros Contatos com o Cordel

Nascido em 1962, no bairro do Alecrim, em Natal, Nando é filho de paraibanos que migraram para o Rio Grande do Norte no final da década de 1950. Criado próximo à feira permanente da Avenida 11, ele cresceu em meio à efervescência cultural da região. Durante seus estudos no Instituto Padre Miguelinho, frequentemente parava para assistir às apresentações de folheteiros que ocupavam as ruas, plantando as sementes de sua paixão pela literatura de cordel.

Ainda jovem, envolveu-se em movimentos políticos e sociais. Em 1982, filiou-se ao Partido dos Trabalhadores (PT), acompanhando campanhas eleitorais que utilizavam a poesia e o repente como instrumentos de mobilização. Em 1984, durante a histórica campanha das Diretas Já, viu o poder da poesia impulsionando lutas democráticas. Foi também nesse ano que testemunhou o impacto do cordel durante a ocupação da Reitoria da UFRN, onde o poeta Adebal declamava versos sobre a luta estudantil.

Início da Produção Cordeliana

Após 25 anos lecionando Sociologia na rede estadual de ensino, Nando mudou-se para São Paulo, onde mergulhou no movimento cordeliano local. Em 2008, publicou seu primeiro cordel, A Turbulência Econômica, pela Editora Luzeiro, a mais antiga do país dedicada ao gênero. Esse marco inicial foi seguido pelo lançamento de outros títulos, como As Mulheres em Luta e A Educação Não é Mercadoria. Em 2009, ajudou a fundar o Movimento Escola Caravana do Cordel, um projeto voltado para seminários, rodas de cordel e oficinas que difundiam técnicas e histórias dessa arte popular.

O Cordel como Instrumento de Educação e Cultura

Ao longo dos anos, Nando consolidou o cordel como uma ferramenta pedagógica. Com projetos como Roda de Cordel nas Escolas, aprovado pelas Leis Aldir Blanc e Paulo Gustavo, ele levou a literatura de cordel às redes públicas de ensino do Rio Grande do Norte. Esses projetos não apenas estimularam o interesse pela leitura, mas também promoveram a reflexão crítica em temas sociais e históricos. Em suas palavras, “O cordel não habita apenas as praças e feiras livres, agora também está presente nas salas de aula, como suporte valioso para o ensino-aprendizagem.”

Pesquisa e Produção Acadêmica

Como pesquisador, Nando publicou artigos e roteirizou documentários como Mulheres Cordelistas na Cena Potiguar e Cordel na Cena Natalense. Sua obra combina o rigor acadêmico com a sensibilidade poética, destacando o impacto do cordel na cultura brasileira. Ele também desenvolve estudos sobre a história e a evolução dessa arte no Rio Grande do Norte, contribuindo para seu reconhecimento como patrimônio imaterial da cultura brasileira.

Obras de Destaque

Nando é autor de inúmeras obras que abordam temas históricos e sociais. Entre elas estão A Saga de Jesuíno Brilhante, que narra a vida do cangaceiro potiguar, e Jararaca, o Cangaceiro que Virou Santo, sobre a invasão de Mossoró pelo bando de Lampião. Em 2018, lançou O Amor no Tempo de Chumbo, um romance em cordel que relata a resistência de dois jovens potiguares à ditadura militar. Mais recentemente, publicou Dias, Noites, Madrugadas: Vida, Paixão e Sangue no Sertão do Cangaço, aprovada pela Lei Paulo Gustavo pela FUNCANTE-NATAL-RN.

Premiações e Reconhecimentos

Em 2023, foi agraciado como Mestre pela Fundação José Augusto na modalidade Cultura Popular e Tradição, destacando-se na categoria Mestras e Mestres pela sua contribuição à literatura de cordel. Em 2024, organizou a antologia Versos de Liberdade: Ditadura Nunca Mais, uma coletânea resultante do 1º Concurso Nacional da Estação do Cordel, realizada no marco dos 60 anos do golpe civil-militar.

Estação do Cordel e o Círculo Natalense do Cordel

Nando é um dos principais organizadores do Ponto de Memória Estação do Cordel, inaugurado em 2017. O espaço tornou-se um polo de resistência e difusão cultural no Centro Histórico de Natal, promovendo exposições, rodas de conversa, oficinas e apresentações artísticas. Também atua como curador do Círculo Natalense do Cordel, evento que, em sua oitava edição, reuniu poetas, pesquisadores e artistas em um amplo debate sobre cordel, repente e liberdade.

Legado e Impacto

Com mais de quatro décadas de dedicação à cultura popular, Nando Poeta é uma referência na promoção e preservação do cordel brasileiro. Sua obra é um testamento vivo da força transformadora da poesia na educação, na cultura e na política. Por meio de seus projetos, publicações e atuação comunitária, ele perpetua uma das mais ricas tradições do Nordeste, mantendo-a vibrante e relevante para as gerações futuras.